Um garoto que gostou de um filme e que a vida inteira nunca descobriu uma paixão maior: Héctor Babenco por olhos e câmera de Bárbara Paz

“Babenco – Alguém Tem que Ouvir o Coração e Dizer: Parou”, de Bárbara Paz (2019)

Rafael Salles
2 min readNov 29, 2021
Poster do filme

Se não fosse amado, tão mais fácil seria pontuar em palavras. Bárbara não se entrega ao melodrama, mas tece a memória com a melancolia necessária para não se perder da missão. A quem não o conhece, é um convite belo; a quem conhece, também é outro convite belo. É o lado íntimo, talvez desconhecido, de seu parceiro. A cineasta, com quem viveu por nove (e os últimos) anos ao lado de Héctor, compartilha de seu cotidiano e entrega uma carta (ou poema?) amorosa ao seu parceiro. Apesar dos 32 anos de doença que Babenco carregara, ele jamais permitiu-se parar. Seu trabalho e paixão jamais puderam ser maiores que o medo. Apesar dos pesares, seria possível impedir a única certeza que se tem na vida? Driblar o temível? Espera! Por mais longos que fossem os caminhos, ele haveria de regressar. Não regressando, haveria de permanecer nas paredes da memória. Se não há arte, não há atemporalidade. Babenco não está em pessoa nesta vida mais, mas seu legado fora deixado, e quem o ama há de lembrar de suas mais diversas formas, assim como ela fez. Nada tão singelo quanto o mundo visto por olhos e câmera de quem o mostra, e o mundo de Paz fora ele. A quem o amor pertence além dos amantes? Ora, aqui, é a todos nós. Ela estende a mão e nos guia, numa belíssima fotografia em preto-e-branco, ao seu interior recheado de carinho; e mesmo reiterando que Héctor não estava pronto para partir e ainda havia muito a nos entregar, o destino é aceitado por ambos. É impossível evitar o inevitável, mas para além do luto, há amor. Se tem saudade, é porque teve amor, e as imagens são transcritas pelo afeto. Há paz, tristeza, melancolia, mas felicidade nas lembranças é o que torna o documentário tão belo, único e pessoal. Encontra tua própria liberdade. Nenhuma ausência é mais funda que a tua. E assim ela o fez. E para o público, é entregado uma das mais belas provas de amor em audiovisual que vi em muito tempo. E por isso eu só sei agradecer. Obrigado!

Descrição da imagem: Héctor Babenco, de olhos fechados, de frente para a câmera. A imagem está em preto-e-branco. É possível ver fios no fundo e um trem passando pela sua esquerda.

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